Projeto prevê suspensão da medida que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos neonicotinoides, em vigor no país desde 2012
Especialistas debateram nesta quinta, dia 4, em audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, na Câmara dos Deputados, alternativas para aplicar agrotóxicos em determinadas culturas sem prejudicar a vida das abelhas. O problema vem sendo estudado no Brasil há pelo menos quatro anos. A audiência ocorreu a pedido do deputado Antônio Roberto (PV-MG).
Representantes de apicultores e do Ministério do Meio Ambiente relataram casos de mortalidade e apontaram como maior culpado o uso de agrotóxicos neonicotinoides. Há suspeitas de que a substância seja fatal às abelhas ou provoque lesões como a perda de orientação no espaço ou de olfato.
Desde 2012 o Ibama e o Ministério da Agricultura estabeleceram regras para o uso de pesticidas à base dessa substância. Na Europa, produtos com neonicotinoides estão proibidos devido aos riscos que causam ao sistema nervoso de insetos polinizadores, o que restringe a área de atuação da espécie e, assim, o rendimento de diversas culturas.
– Abelhas saem e não voltam para as colmeias porque perdem a orientação. Ou não encontram as flores a serem polinizadas porque não têm olfato – explicou o presidente da Confederação Brasileira de Apicultura (CBA), José Cunha, representante de 350 mil apicultores. Segundo ele, não há um número exato de mortes no Brasil, mas o fenômeno é mundial.
No país, ficou proibida a pulverização aérea de agrotóxicos neonicotinoides que contenham os ingredientes ativos Imidacloprido, Tiametoxam, Clotianidina ou Fipronil. Um projeto de decreto legislativo (PDC 809/12), no entanto, prevê a suspensão da medida, prevista em decisão do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
O PDC está pronto para análise da Comissão e recebeu parecer pela aprovação do deputado Duarte Nogueira (PSDB-SP). O deputado Antônio Roberto, no entanto, adiantou que, quando a proposta chegar à Comissão de Meio Ambiente, trabalhará por sua rejeição.
O argumento de Duarte Nogueira é de que o Ibama extrapolou suas atribuições legislativas e que a medida pode causar prejuízos ao país. O coordenador-geral de Avaliação e Controle de Substâncias Químicas do Ibama, Márcio Freitas, porém, rebateu dizendo que cabe ao Ibama regular agrotóxicos. Ele disse ainda que, em resposta às demandas dos produtores, o instituto flexibilizou a regra, permitindo a pulverização dos agrotóxicos nas culturas de soja, cana, trigo e arroz fora da floração, caso não haja outra alternativa disponível e viável. Somente as lavouras de algodão podem ser pulverizadas.
– Não temos nada contra a aplicação aérea, mas dizer que ela é segura é complicado. A gente sabe que não há controle sobre toda a aplicação aérea no país – destacou Márcio Freitas. Na avaliação do coordenador, faltam regulações claras, o que teria levado, em maio deste ano, em Rio Verde (GO), um avião a pulverizar em cima de uma escola, intoxicando 42 crianças.
– A soja é um dos produtos que necessita do uso de agrotóxicos. Se nós utilizarmos uma ou duas substâncias, logo haverá uma resistência e as pragas não serão controladas – alerta o chefe-geral do Centro Nacional de Pesquisa de Soja da Embrapa, Alexandre José Cattelan.
– O que nós vemos é que o governo reagiu em estudos baseados no Sudeste do país. Mas o Centro-Oeste, que tem a maior produção de soja do Brasil, seria extremamente prejudicado – aponta o diretor executivo da Aprosoja, Fabrício Rosa.
Segundo especialistas, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, com a utilização de 300 mil toneladas por ano. Por isso, é cada vez mais importante aprofundar os estudos, para que o uso de determinados produtos não causem riscos a biodiversidade do país.
– Não somos apenas o maior consumidor do mundo, como temos uma biodiversidade nativa que ainda não foi estudada e catalogada, e que sofre os efeitos desses agrotóxicos, já que a substância atinge áreas nativas – acrescenta Maria Cecília.
Para o Ibama, o primeiro passo para se tomar uma decisão em relação à restrição do produto é a conclusão desses estudos.
– Para que tomemos uma decisão no sentido de restringir esse produto, precisamos concluir nossos estudos. Esses produtos não só causam a morte das abelhas, mas também uma desorientação. Por isso, ainda há dúvidas de qual a dose, como isso acontece. Os estudos que estão acontecendo são estudos novos que antes não eram realizados – opina Márcio Freitas.
Abelhas são responsáveis pela polinização de 70% das culturas
As abelhas, principalmente as silvestres, são responsáveis pela polinização de cerca de 70% das culturas,que respondem por 90% da oferta global de alimentos. A mortandade desses foi batizada de Colony Collapse Disorder (CCD) e identificada inicialmente nos Estados Unidos, no inverno no fim de 2006, quando apicultores relataram perdas de 30% a 90% de suas colmeias.
– Cerca de 90% da comida consumida no mundo vem da polinização e cerca de 43% são polinizadas por espécies de abelhas. Apesar de algumas plantas não dependerem da polinização específica para a reprodução, elas são beneficiadas por esses insetos – ressalta a pesquisadora da Universidade Federal da Bahia, Maria Cecília de Lima e Sá de Alencar Rocha.
De acordo com a CBA, a agroindústria tem ganho de 20% em sua produção em função da polinização natural de abelhas e aves. Em termos globais, os serviços de polinização prestados pelas abelhas no ecossistema ou nos sistemas agrícolas são avaliados em US$ 54 bilhões por ano.
Fonte: RuralBR
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